Líderes dos Recursos Humanos de empresas de todos os portes estão passando por um mesmo desafio neste momento: como lidar com a comunicação interna nesse momento de crise? Enquanto é essencial resguardar a saúde e o bem-estar das equipes, também é imprescindível que a economia brasileira continue girando.

Por isso, a Gestão RH, com apoio da Ahgora, promoveu o webinar “Comunicação Interna em Tempos de Crise”. O bate-papo envolveu grandes nomes do RH, que compartilharam suas experiências diante desse momento – de forma remota.

Glaucimar Peticov, Diretora Executiva do Bradesco; Cristina Caresia, Diretora de RH da Tenda Construtora e Ricardo Burgos, Vice-Presidente da Amil com a moderação de Ricardo Mota, Diretor da Saad Company, falaram sobre o que está dando certo e suas estratégias para atravessar os tempos de COVID-19

Nós construímos esse artigo com alguns principais pontos do webinar para você ficar por dentro do que as corporações têm feito a fim de minimizar os efeitos e tirar muito aprendizado dessa situação sem precedentes.

Atravessando a quarentena 

Sem dúvidas, a crise instaurada pelo coronavírus tem feito os RHs das empresas se reinventarem. De uma hora para outra, muitos colaboradores foram obrigados a trabalhar de casa e as empresas precisaram se adequar a uma situação nunca antes vivida.

“Os RHs estão sendo muito demandados. A gente sempre ouviu falar que o RH precisa ser parceiro do negócio e, agora, as coisas se inverteram um pouco. É o negócio que deve ser parceiro do RH no momento”, comenta Cristina, que está à frente do RH da Construtora Tenda. Calma, serenidade e tranquilidade são essenciais para enfrentar esses tempos difíceis. 

Muitos setores estão sofrendo as consequências desse cenário. O dia a dia de muitas pessoas foi alterado e esse aprendizado deve ser visto como algo muito significativo. “Eu nunca tinha vivido essa situação de trabalhar no formato home office. E são muitos desafios. Da empresa, pessoais, profissionais, a dinâmica familiar que muda… é a hora de reconhecer e aprender a viver com as nossas fraquezas”, diz Glaucimar, que responde pelo departamento de RH do Bradesco. 

Os desafios da comunicação interna na crise

A comunicação é imprescindível para qualquer empresa. E isso sempre foi assim. Mas, em um momento como esse, como é possível atuar com a área de comunicação? Eles responderam.

Cristina

Como a comunicação fica abaixo do “guarda-chuva” dos Recursos Humanos, isso traz bastante agilidade para a empresa. O que mudou nessa dinâmica é a velocidade… não dá para esperar para fazer um vídeo ou um comunicado só amanhã ou daqui a dois dias. As pessoas estão querendo saber mais e a todo momento e precisamos atender essa demanda. 

Um segundo ponto é que a distância nos aproximou. Nós temos preferido fazer vídeos com a equipe; isso porque se a informação chega fria ela pode ser maléfica. Então, trocamos os e-mails, que é uma comunicação mais “fria, por videoconferências. Também  implantamos uma rede social interna em tempo recorde. Estamos tentando aprender, ser ágeis e ter uma comunicação frequente e afetiva, usando até canais que não usávamos antes.

Há uma grande reflexão acontecendo nesse momento. Se os funcionários estão dizendo que estão se sentindo mais próximos da empresa, aí vem o questionamento: será que não estávamos comunicando da forma certa antes da crise? 

Glaucimar

O nosso RH, que é muito envolvido e conectado com o marketing, faz com que a mensagem seja passada de forma bem mais humanizada. Há uma prioridade na comunicação interna em função da abrangência do banco, pois estamos em todo o país. Vemos uma necessidade de comunicação permanente, que está acontecendo numa velocidade que antes não se conhecia. 

A marca do Bradesco foi desconstruída de forma afetiva. Estamos levando a mensagem de que podemos estar juntos, mesmo à distância. Também implementamos uma espécie de call center de atendimento com uma equipe de médicos, psicólogos, coachings, assistentes sociais – mais de 200 pessoas trabalhando para tirar dúvidas e ficar à disposição dos nossos colaboradores. Isso foi necessário para dar a devida atenção que a situação necessita. 

Além das frentes usuais (e-mail, videoconferência, redes sociais, whatsapp), estamos com outros recursos que têm trazido um retorno muito legal. São vídeos de curta duração. Em um primeiro vídeo, nosso presidente de forma tranquila e transparente falou sobre os casos e o que estamos fazendo para enfrentar a crise, deixando claro que ninguém está sozinho. 

O outro vídeo foi feito por mim para mostrar a importância de cada um no processo, com números. Aquela expressão ‘somos onda do mesmo mar’ vale muito para o momento. E uma outra iniciativa é o ‘live office’, em que cada funcionário filma como está administrando o trabalho de casa. É uma forma de engajar e mostrar que existe muita igualdade nas diferenças. Isso está fazendo com que as pessoas se sintam próximas. 

As comunicações voltadas para negócio são quase inexistentes. A nossa comunicação institucional hoje está muito na linha de apoio, transparência, cuidado com pessoas do nível de risco… esse movimento está voltado ao cuidado com cada um. Mudamos a forma de falar com as pessoas. Hoje o negócio não é o mais importante, são as pessoas.

Ricardo

É um momento muito desafiador, tanto pessoal quanto profissional. Nós não temos essa noção mais tranquila de home office porque trabalhamos 24 por 7, o tempo todo. Costumamos dizer que não dá vontade de parar de trabalhar, principalmente em um momento como o que estamos passando. E esse tem sido o ritmo dos nossos mais de 40 mil colaboradores. Tentamos encarar de forma positiva, ver a família quando dá tempo e manter a cabeça positiva porque isso é fundamental. 

Dificuldades em manter a comunicação interna na crise

Por muitas vezes, conseguir se comunicar com os líderes pode não ser uma tarefa fácil. Agendas complicadas e outros desafios permeiam o processo. E, nessa situação, é mais difícil se comunicar com os gestores? Veja como está sendo a experiência dos RHs.

Cristina

São dois elementos importantes nessa questão. Os RHs sempre trouxeram que o papel do gestor também é de comunicador. E dá pra ver que isso ainda é muito novo para os gestores, assumir essa função ainda é um desafio. E esse momento que estamos passando exige que o gestor seja o porta-voz. O que estamos fazendo é tornar isso real, para que os gestores possam fazer a disseminação das informações que possuem e se comunicar com seus times. 

Mas, eles também possam ser vulneráveis. Muitos deles agora neste momento vão dizer que não têm a resposta certa. E tudo bem isso acontecer agora. Existe uma comunicação muito mais frequente, muito rápida e informal. O maior desafio é que eles passem a mensagem para as suas equipes e que sejam os grandes porta-vozes da empresa. Temos dedicado nossos esforços nessa questão. 

Também fizemos um material de home office. O que precisa é ter bom senso, estamos pedindo isso. É preciso respeitar a situação de cada um. Tem mães, por exemplo, que precisam parar porque a escola mandou atividades do filho… é preciso respeitar isso. 

Precisamos fazer o momento de feedbacks de avaliação de desempenho do ano anterior. Então, fizemos uma capacitação sobre feedbacks virtuais. Tem que haver um respeito na comunicação, tanto com aqueles que estão em home office quanto com os que estão trabalhando normalmente. Na nossa empresa, metade está em casa e a outra não. 

Glaucimar 

Percebemos que à distância o trabalho exige uma postura mais disciplinada nas equipes para garantir a fluidez e o impacto das informações. Disciplina, frequência, um tom mais humanizado, inclusive ao passar demandas para preservar o senso de pertencimento. 

Hoje, um dos grandes desafios junto ao gestor está voltado a neutralizar as emoções negativas da situação. Geramos um kit com dicas de como lidar com o time à distância. Com isso, o gestor não se sente sozinho e desamparado. Começamos falando da importância de fazer reuniões sistemáticas e de estar sempre em contato com a equipe, por exemplo. São situações importantes para que o trabalho continue e exista o respeito pelo colaborador estar em casa. 

Nossa prioridade é demonstrar de uma forma muito transparente a preocupação literalmente genuína da organização com a saúde e o bem-estar das pessoas. É o ponto mais importante. Há muitas pessoas em isolamento apenas, não em home office. Abrimos o site da nossa unidade corporativa (Unibrad) para capacitação à distância. A ideia é aproveitar o momento para que o próprio colaborador invista em seu desenvolvimento. 

Lidando com a incerteza e insegurança 

Os sentimentos gerados pelo momento também merecem atenção. Os convidados falaram como está sendo a experiência nesse sentido. 

Cristina

Não dá para ter vergonha de ser vulnerável nesse momento. Porque as angústias que os colaboradores sentem, nós também sentimos. O que temos sentido é que as pessoas querem falar. E temos espaços específicos para que isso aconteça.

O principal papel do RH é ser um ponto de apoio de todos para trazer essas angústias para o diálogo. Estamos fazendo pesquisas para sentir como as pessoas estão olhando a organização. Isso será feito semanalmente para podermos investir os esforços onde é relevante nesse momento.

Glaucimar 

Lidamos com equipes de gerações distintas. E interpretando as necessidades das pessoas dá para entender que elas ultrapassam o isolamento. E esse isolamento não é só físico. Estamos lidando muito com medos, dúvidas, inseguranças. 

Por exemplo, temos situações de o funcionário estar trabalhando e não ir pra casa para que a família não corra riscos. Como fazer para não ter contato? Outros que, por medo, estão fechados em seus quartos. O fator psicológico é muito forte. Estamos com profissionais qualificados à disposição para trabalhar com tudo isso. Um dos maiores desafios dessa situação é neutralizar essas sensações. É um ponto muito delicado para estar atento. 

Ricardo

É um grande desafio, uma situação sem precedentes. Nós temos 32.000 colaboradores trabalhando na linha de frente. Temos um programa de apoio ao colaborador e isso tem sido fundamental porque é um público que está lidando com vida e morte a todo o tempo. E com a própria saúde deles mesmos. 

Falando com o mercado 

Eles também comentaram sobre o discurso final para o mercado consumidor, veja:

Glauciane 

O trabalho é grande com os clientes. Temos um grande desafio com relação aos aposentados. No caso do banco, a orientação é diária e permanente sobre a questão da distância e evitar aglomerações. E é difícil porque estamos falando com várias camadas da sociedade e muitas são incrédulas com relação a essa situação. 

Desenvolvemos algumas facilidades no sentido mobile e aceleramos o processo de criação em função da pandemia em prol de um atendimento mais facilitado. Estamos enfrentando, inclusive, dificuldades para buscar álcool gel, máscaras… o cliente, no nosso caso, precisa ser continuamente orientado para assumir o seu papel de responsabilidade enquanto sociedade. 

Ricardo

Precisamos fazer com que a informação seja levada aos nossos clientes de forma compreensível. Isso porque existem diversas denominações técnicas que precisam ser literalmente “traduzidas”.

O COVID-19 é uma grande luta mas nós também temos desafios em outras áreas da saúde, como cardiologia, obstetrícia… estamos usando números e sendo transparentes sobre como estão as coisas. E nós precisamos manter essa operação acontecendo de maneira sustentável, o que não é fácil. Mas temos tido avanços importantes.

Para refletir…

O que virá depois? “É bem importante que as lideranças passem uma mensagem  serena nesse sentido. De aprendizado e de que vamos sair ainda mais fortes. É preciso ver os efeitos positivos”, acredita Cristina. Para Glauciane, “o momento fará com que as empresas saiam diferentes do que eram. A tecnologia, com certeza, está ajudando muito, mas a competência humana é insubstituível e prevalece”, finaliza.

“A liderança vai ser muito mais humanizada com a serenidade necessária. Foi uma grande oportunidade para aprender e oxigenar um pouco no meio disso tudo”, completou Ricardo.